domingo, 12 de maio de 2013

Crônica 7 “In memoriam”



João Batista de Freitas
Meu querido irmão Luiz, falecido com apenas 58 anos, era apenas 3 anos mais velho do que eu. Passamos quase toda a infância juntos, vendo os irmãos mais velhos saírem de casa para estudar fora, procurando um jeito de achar um caminho melhor na vida, já que éramos uma família bastante pobre. Assim, Luiz se tornou uma espécie de protetor e mentor para mim, ensinando-me quase tudo: fazer e soltar pipa, usar arco e flecha, manejar um martelo, jogar bola e bolinha de gude, escrever em letra de forma, os primeiros acordes no nosso velho violão, andar de bicicleta e muitas outras coisas gostosas da infância.
Assim, quando eu tinha dúvidas, era a ele que eu perguntava primeiro, mas nem sempre as respostas eram exatas, até porque ele também era uma criança.
- Luiz, o que é horizonte?
- É Deus, Magrelo!! (como ele me chamava )
E assim fomos crescendo, cheio de dúvidas e meias verdades. Mas a maior de todas foi a que conto agora. Por volta do final dos anos 60, nós, que já gostávamos muito de música, curtíamos Beatles e Simon & Garfunkel. E, claro, eu não sabia nada de inglês, mas gostava de cantarolar como se soubesse o que falava. Na época, a música de sucesso da dupla era “The Boxer”, que nós ouvíamos e tentávamos “tirar” no violão – em dó maior, lembro-me bem. Aí eu fiz a fatídica pergunta:
- Luiz, o que fala a letra da música?
E sua resposta foi maravilhosa para um pré-adolescente, mais ou menos assim:
- Conta a história de um boxeador. Ele era pobre, mas muito forte, e gostava de lutar. Então, tornou-se um boxeador e ganhava todas as lutas. Mas apareceu outro boxeador, tão bom quanto ele, também invicto. Este boxeador lutava sempre mascarado, e sua identidade era desconhecida. Até que um dia o inevitável aconteceu: ambos tiveram de se enfrentar, porque eram os únicos invictos da categoria. Mas o boxeador era melhor, e bateu tanto no mascarado que ele morreu no ringue. E quando tiraram a sua máscara, ele viu que era seu irmão.
Oh, meu Deus, quanta imaginação!! Não preciso dizer mais nada. Mas até hoje, quando escuto esta bela canção, fica no meu imaginário a história contada pelo meu saudoso irmão. Para quem não conhece a música e a letra, segue abaixo o original e uma versão livre que peguei na internet. Tirando o fato de que o cara era realmente pobre, a música, apesar da bela história, nada tem de tanto imaginoso.
Fique em paz, irmão! Um dia nos veremos aí em cima!

The Boxer
I am just a poor boy
Though my story's seldom told
I have squandered my resistance
For a pocket full of mumbles
such are promises
All lies and jests
Still a man hears what he wants to hear
And disregards the rest
When I left my home and my family
I was no more than a boy
In the company of strangers
In the quiet of the railway station running scared
Laying low,
Seeking out the poorer quarters
Where the ragged people go
Looking for the places only they would know
Lie la lie...

Asking only workman's wages
I come looking for a job
But I get no offers,
Just a come-on from the whores on Seventh Avenue
I do declare,
There were times when I was so lonesome
I took some comfort there
La, la, la,
Now the years are rolling by me, they are -[rockin evenly]-
I am older than I once was
And younger than I'll be that's not unusual.
No it isnt strange after changes upon changes
We are more or less the same
After changes we are more or less the same
Lie la lie...

Then I'm laying out my winter clothes
And wishing I was gone
Going home
Where the New York City winters
Aren't bleeding me
leading me, going home
In the clearing stands a boxer
And a fighter by his trade
And he carries the reminders
Of ev'ry glove that layed him down
Or cut him till he cried out
In his anger and his shame
"I am leaving, I am leaving"
But the fighter still remains
Lie la lie...

O Boxeador
Eu sou apenas um menino pobre
Embora minha história seja raramente contada
Eu despedacei minha resistência
Em troca de um bolso cheio de resmungos
Feito promessas
Tudo mentiras e chacota
Ainda assim, um homem ouve o que quer ouvir
E descarta o resto
Quando eu deixei meu lar e minha família
Eu não era mais do que um menino
Na companhia de estranhos
Na quietude de uma estação de trem, fugindo amedrontado
Mantendo-se escondido
Buscando os alojamentos mais baratos
Onde o povo esfarrapado vai
Procurando os lugares que apenas eles saberiam

Solicitando apenas salário de trabalhador
Eu vim procurando por um emprego
Mas não recebo ofertas
Apenas um vem cá das garotas da Sétima Avenida
Eu declaro
Houve momentos em que estava tão solitário
Que tomei algum conforto lá
Agora os anos estão passando por mim,
Eles estão agitando uniformemente
Eu sou mais velho do que eu fui uma vez
E mais novo do que serei, isso não é raro.
Não, não é estranho depois de mudanças e mudanças
Nós somos mais ou menos os mesmos
Depois de mudanças somos mais ou menos os mesmos
Lie la lie...

Então estou estendendo minha roupa de inverno
E desejando que estivesse partido
Indo para casa
Onde o inverno da cidade de Nova York
Não estivesse me sangrando
Me levando, indo para casa
Na clareira em pé está o boxeador
Um lutador por ofício
E ele carrega uma lembrança
De cada luva que lhe abateu
Ou lhe cortou até gritar
Em sua raiva e sua vergonha
"Estou indo embora, estou indo embora"
Mas o lutador ainda permanece...

            Se quiser ouvir e assistir ao vídeo de Simon e Karfunkel: