terça-feira, 29 de novembro de 2011

Causo 39 Ecológico?

Nicanor de Freitas Filho
            O meu amigo e ex-patrão, que aderiu aos ecologistas, era também Rotaryano, que ele insistia chamar de “Jantariano”, pois segundo ele, mais se “jantava” do que se relacionava socialmente, objetivo principal do Rotary Clube Internacional.
            Apesar desta observação, ele muito trabalhou pelo Rotory Clube, não só de São Paulo, como o de Itaquaquecetuba, para o qual me convidou. Tornei-me assim um Rotaryano e gostei muito do período em que pude fazer alguma coisa pelos outros e relacionar socialmente, conhecendo várias pessoas, com quem mantenho amizade até hoje, inclusive com ele. Isto porque, quem é Rotaryano sabe, que além das reuniões semanais do Clube a que se está associado, geralmente, uma ou duas vezes por mês, algum clube amigo promove eventos e os demais clubes são convidados a participar.
            Como já expliquei no causo anterior, esse meu amigo além de outros problemas cardíacos, tinha o colesterol elevadíssimo, perto de 300, mas às vezes não resistia às deliciosas iguarias que se serviam nestes “jantares”, e mandava ver.
            Num desses eventos, que não me lembro de qual clube era, foi realizado num Restaurante que tinha na Marginal Tietê, logo depois do Viaduto Aricanduva, se não me engano, chamava Buffet Casagrande.
            Como sempre, as mulheres se reuniam numa mesa e os homens em outra, para se “fofocar” mais a vontade, de ambos os lados. Nesse dia o prato principal era “leitão a pururuca”. Meu amigo não pensou duas vezes e fez “aquele” prato de leitão, com aquela casquinha bem torradinha e o miolo bem gorduroso. E estava comendo e bebendo, como sempre, com muita alegria, no meio dos amigos e provavelmente fazendo uma das espirituosas brincadeiras, que era sua marca. Como por exemplo, dizer que no jantar do Clube dele, a sopa vinha tão fria e cerveja tão quente, que geralmente ele colocava a cerveja pra gelar dentro do prato de sopa...
            Como as mulheres, geralmente comem menos, terminam primeiro. E a esposa dele, que sempre ficava de olho, tentando controlar o que ele comia, levantou-se da mesa em que estava e veio até à mesa em que estávamos. Ao ver o lauto prato de leitão a pururuca à frente dele, já falou com aquele tom de censura:
            “ – Homem de Deus, como você come um prato desses, com o colesterol lá em cima, como você está?” No que ele respondeu sem pensar:
            “ – Calma mulher, estou comendo leitão ecológico, tratado com ração à base de soja, com muito ômega  6  e gramíneas sem agrotóxicos, só bebe água potável...”

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Causo 38 Quantas Estrelas


Nicanor de Freitas Filho

            Aí pelo final dos anos 80, quando o Sarney era Presidente da República, e o País estava numa grande dificuldade financeira, pois o incompetente Presidente tinha declarado moratória, num ato totalmente desastrado, assisti a uma entrevista, pela televisão, mas não me lembro o canal nem o entrevistador, com o eterno presidente do Corinthians, o Sr. Vicente Matheus, que eu tive o privilégio de lançar o livro sobre a vida dele, de Luis Carlos Ramos, quando eu era Gerente Comercial da Editora do Brasil: “Quem sai na chuva é pra se queimar”.
Como se pode ver pelo próprio título, esta era uma marca inconfundível do Sr. Vicente Matheus. Falava algumas coisas realmente engraçadas, pela confusão que fazia com trocas de palavras, ou fazia por gosto mesmo, não sei bem. O dia que contratou o jogador Birobiro, disse para imprensa que tinha contratado o “Lerolero”... Um dia ele quis dizer que tinha vitiligo e disse que tinha “logotipo”...
            O entrevistador, obviamente, só explorava este lado do Sr. Vicente, sempre pedindo confirmação se ele tinha mesmo falado tal e tal coisa. A maioria ele confirmava e algumas ela dizia que nunca tinha dito aquilo, que era invenção da oposição – que era o que mais tinha, coitado...
            Aí, no meio da entrevista ele disse que as coisas que ele falava, realmente engraçadas ninguém publicava. Ele disse que era espirituoso e de raciocínio muito rápido, e, às vezes cometia algum deslize por isso. Então o entrevistador disse para ele contar alguma coisa espirituosa que ele disse e que ninguém publicou.
            Ele contou que tinha uma Pedreira e vendia muito para quem ele não conhecia, mas nesse caso, ele só vendia a vista e em dinheiro. Um dia chegou lá um senhor, com dois caminhões caçamba e perguntou se tinha lá um tipo de pedra. Ele disse que sim e o camarada, mandou encher os dois caminhões. Entrou no escritório e perguntou quanto era. O Sr. Vicente, que estava sempre por lá, falou o preço e o camarada tirou o talão de cheques e começou a fazer o cheque, no que o Sr. Vicente disse que não aceitava cheque. O camarada todo ofendido e querendo se explicar disse que, afinal era um cheque com 5 estrelas – ou seja, tratava-se de cheque especial – do Banco Itaú. O Sr. Vicente olhou bem no fundo dos olhos do fulano e disse:
            “ – Estrelas por estrelas o Brasil tem 27 na sua bandeira, mas não paga ninguém...

sábado, 19 de novembro de 2011

Causo 37 Matei o Morcego!


Nicanor de Freitas Filho
Do longo caso de coincidências que contei, sobre uma viagem de negócios que fiz em 1982, tem continuação. Era uma viagem por vários países, e, por causa da Guerra das Malvinas, tive que pular a Argentina. Com isto antecipei em dois as agendas e os vôos para os demais países. Tive então, que ir “remarcando” datas, bem como todos os vôos. Quando cheguei em Porto Rico, penúltimo destino do planejamento, ocorreram coisas que acho que só comigo acontecem!
            Tinha reserva para o Hotel Hilton de San Juan. Mas cheguei com dois dias de antecedência. Não tinha vaga no Hotel. Estava totalmente lotado! A recepcionista disse-me: “ –  pode vir depois de amanhã que sua vaga está aqui devidamente registrada.” O pior é que já era por volta das 22:00 h. Depois de muito discutir com a recepcionista e o Gerente, que me explicaram sobre um congresso médico que se realizava lá, resolvi tomar um taxi e ir para outro hotel. Conversei com o taxista e ele se prontificou a me levar em outro hotel. Levou-me para um que ficava na mesma avenida do Hilton, creio que se chamava Las Conchas; estava lotado. Tentou o Hotel Miramar, lotado. Fomos para o Casa Blanca, lotado. Então ele me disse para tentarmos os menores, mais da periferia, pois tinham vários eventos ocorrendo em San Juan. Achou um hotelzinho que na verdade eram três sobrados geminados, que foram juntados. Já passava de meia noite e eu estava cansado, pois já estava há quase 30 dias fora de casa e só viajando...viajando... Fiquei ali mesmo!        Quando fui tomar banho, o chuveiro ficava sobre uma banheira, que eu já não gosto, porque sempre escorrego. Mas vá lá! À medida que eu me ensaboava a banheira foi enchendo, mesmo com o ralo aberto. A água chegou quase aos joelhos.  No outro dia pela manhã ainda tinha um pouquinho de água lá.         
Eu carregava comigo cerca de dois mil dólares – lembra que naquele tempo não se podia usar o cartão de crédito – e eu não me sentia nem um pouco seguro naquele lugar estranho. Peguei o dinheiro, coloquei debaixo do travesseiro, tranquei a mala, encostei uma mesa e cadeira na porta e estava tão cansado que dormi. Para se ter uma idéia, nem café da manhã tinha, no tal hotel. Saí de lá carregando as malas e tomei um taxi e pedi para me levar para um outro hotel. Este taxista me ajudou em muito. Levou-me para o Hotel Excelsior, na Avenida Ponce de Leon. Um hotel pequeno e tranqüilo e ótimo para quem estava a negócios. Voltei a ficar lá mais duas vezes, nos anos seguintes.     
Como disse o hotel é simples e as cortinas eram deste tecido que chamam de “black-out”, parecido com plástico grosso, que descia do teto até o chão. Quando cheguei ao hotel, à noite depois do trabalho, ao descer do taxi, vi passar um “pássaro” voando de forma estranha. O taxista me falou, que era um morcego. Eu estava no 7º andar e como estava calor eu deixei a janela semi-aberta.
Foi na TV deste hotel, que eu vi, pela primeira vez a Madonna cantando, num show em Porto Rico. Acredito que ela ainda não tinha gravado. Lembro-me que ela vestia uma capa de chuva, ou algo parecido, que achei estranho. Não me lembro das músicas, apesar de ter na cabeça que ela contou uma que se chamava “Everybody”, mas gostei do show dela e a achei muito bonita! Ela devia ter 22 ou 23 anos.
Depois de ver o show da Madonna, dormi. Acordei por volta das 4 horas da manhã, com um barulho estranho, atrás da cortina. Era um plác-plác-plác e parava. Daí a pouco o plác-plác-plác de novo.  Então vi que um morcego tinha entrado no quarto e estava se debatendo atrás da cortina. “Como vou matar este bicho?”, pensei. Levantei fui ao guarda-roupa peguei um desses cabides de madeira pesados, fui para o lado da cortina, fiz pontaria, bem onde a cortina balançava e soltei 3 ou 4 cacetadas, mas o bicho continuava a se debater. Imaginando que já o tivesse machucado o suficiente para que ele não fugisse, puxei a cortina e não o vi. Aí então acendi a luz para ver se o encontrava no chão. Não o encontrei mas, já na claridade, pude perceber que tinha feito um belo estrago na parede, e, notei que ventava e era o vento que batia na tal cortina de plástico, fazendo-a ondular o que fazia o barulho do “morcego se debatendo atrás da cortina”.

domingo, 13 de novembro de 2011

Causo 36 Êta Motorista Bom!

            Nicanor de Freitas Filho
            Num dos cursos que fiz na FGV, de Gestão de Negócios, tive aulas com um Professor, que também era palestrante e quase todos os dias encerrava as aulas com um “causo”. Um deles eu guardei e vou tentar contar aqui, sem o sabor humorístico dele, é claro.
            Contou que um palestrante se especializou num assunto importante e ficou famosíssimo e por isso fazia palestras todos os dias, e em alguns dias mais de uma apresentação. Ele tinha um motorista que, em decorrência do tempo que ficavam juntos se tornaram amigos. Até trocavam algumas confidências. Às vezes reclamava da platéia, às vezes das longas viagens e falava que estava de “saco cheio” de tanto repetir as mesmas coisas. Mas era aquilo que queriam ouvir, e ele conhecia bem o assunto, fazer o que? Era o seu ganha-pão!
            O motorista tinha que esperá-lo, então ele sempre exigia comida para os dois, se fosse mais longe e tivesse que dormir, exigia dois quartos, ou seja, o motorista era companheiro para todas as horas. E já fazia anos que trabalhavam juntos. Geralmente o motorista entrava nas salas de palestras, ajudava conferir o material e a maioria das vezes, sentava-se num canto da sala e lá ficava.
            Num dia, tinham uma viagem meio longa, para uma cidade que nunca tinham ido antes. Quando entrou no carro, o palestrante começou a conversar e como sempre aproveitava para fazer as reclamações. Levou os braços para cima, num movimento típico de preguiça e disse ao motorista: “- Hoje estou de ‘saco cheio’. Só vou fazer esta palestra por causa do contrato, senão iríamos descansar hoje.”
            O motorista perguntou se alguém o conhecia naquele local que estavam indo. Ele disse que não. Era a primeira vez que ia a tal lugar. O motorista confirmou se não tinha mandado fotos ou coisas assim. Ele disse que não. Então o motorista perguntou: “- Se o senhor está de ‘saco cheio’ e sem vontade de fazer a palestra, se quiser eu posso fazer para o senhor, pois de tanto ouvi-lo, sei de cor, tudo o que o senhor fala. Sou capaz até de responder aquelas perguntas que lhe fazem depois da palestra.”
            Meio surpreso mas alegre, fez umas três ou quatro perguntas para o motorista que as respondeu sem titubear, com firmeza. Então combinaram que mais perto da chegada, trocariam de lugar, ele chegaria dirigindo, passando-se por motorista e o motorista faria a palestra.
            E assim foi. O motorista se apresentou, fez uma brilhante palestra, usando todos os recursos de oratória e todos os termos técnicos de forma correta. Uma perfeição! O palestrante chegou até sentir um pouco de ciúmes, pelo entusiasmo com que o motorista foi aplaudido no final. Então vieram as perguntas, que ele tirava de letra uma a uma, com firmeza e brilhantismo. De ciúmes, passou a ter orgulho, pois afinal de contas, era exatamente como ele fazia, aprendera com ele!
            De repente, veio uma pergunta, dessas atravessadas, bem diferente de tudo que já tinha ouvido. Ele não fazia a mínima idéia do que se tratava, pois ele só tinha decorado o que acontecia nas palestras anteriores. Não entendia do assunto! Com a maior firmeza e frieza, disse ao interlocutor:
            “- Meu amigo, sua pergunta é tão simplória que vou pedir ao meu motorista, ali no canto, para lhe responder...”

domingo, 6 de novembro de 2011

Causo 35 Adesão Ecológica

Nicanor de Freitas Filho
            Quando voltei de Cuiabá, onde morei e trabalhei por dois anos, fui trabalhar numa indústria de artigos de festas em Itaquaquecetuba, cidade da Grande São Paulo, cuja fábrica ficava, literalmente, no meio do mato. Inteligentemente, um dos donos adquiriu um terreno grande vizinho à entrada da fábrica e fez ali, sua casa de campo. Como ele mesmo dizia, tinha uma casa de campo, que na sexta-feira à tarde, não precisava nem pegar o carro para chegar nela, tinha segurança 24 horas por dia, auxiliares, além de outras facilidades, como por exemplo, nos dias de semana, convidava um dos gerentes para ir jogar sinuca com ele, após o expediente. Tinha gente para limpar e cuidar da casa e tudo mais.
            Ele adorava um churrasco e sempre encontrava motivo, como festas de final de ano ou outros eventos para contratar um churrasqueiro, o Gaúcho, para preparar uma deliciosa costela de boi, ou picanha ao ponto, ou rolha ou miolo da alcatra (carne que se deve comer quase crua) e outras especiarias grelhadas. E ele, mesmo com o colesterol a quase 300, fazia de conta que não era com ele, comia de tudo e muito, além de fazer acompanhar a cervejinha.
            Mas a casa de campo também servia de refeitório da Diretoria e alguns poucos gerentes. E muitas vezes iam convidados almoçar lá conosco – porque eu era um dos privilegiados que almoçavam e jogavam sinuca – como gerentes de bancos, clientes, advogados, alguns fornecedores especiais, ou seja, aquelas pessoas que geralmente querem conhecer as empresas com quem estão trabalhando.
            Ele era, e ainda é, muito espirituoso e gozador. Tinha algumas coisas que fazia e que mesmo a gente conhecendo e sabendo o que ia acontecer, ainda assim eram engraçadas. Por exemplo, quando tínhamos convidados para o almoço ele, como bom português, tinha sempre uma bela salada de verduras de entrada, regada com muito azeite. (Depois conto o caso do livro que ele escreveu e que deu o título de “O Galo que bota”). Invariavelmente, ele fazia com que todos se servissem da salada. Pegava a bandeja e insistia com todos para se servirem e também, invariavelmente, ao final, alguém lhe perguntava se ele não comia salada, pois ele mesmo não se servia; ao que ele respondia, com o maior bom humor:
            “ – É que eu me aderi aos ecologistas, não como nada que é verde e se tiver algum animal que como o verde, eu como o animal para ele não comer o verde!”

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Causo 34 Na Argentina e Chile


Nicanor de Freitas Filho
Fui Gerente de Exportação da Cia. Melhoramentos e viajei muitas vezes ao exterior, para vender cadernos escolares. E vendi muito!
Em 1982 programei uma viagem que começava por Paraguai, Uruguai, Argentina, Chile... Saí do Brasil no dia 31 de março de 1982. Trabalhei no Paraguai  e no Uruguai nos dias 31/03,1º e 2/04, e quando cheguei no Hotel, ainda em Montevidéu, ouvi notícias que a Argentina tinha invadido as Ilhas Falklands, que eles insistem em chamar de Malvinas. Não dei muito ouvidos, no sábado ainda tive uma reunião de trabalho e no domingo fui passear e conhecer Montevidéu. Passeei e de tardezinha, peguei a ponte-aérea para Buenos Aires.
Levantei-me cedinho peguei um taxi e fui para o escritório do nosso pretendente a representante. Era um alemão que vivia há muitos anos na Argentina.
            Ao sair do hotel, levei um susto, pois na Avenida Corrientes, bem perto Calle 25 de Mayo, tem um prédio do Banco de La Provincia de Buenos Ayres, que deve ter um 12 ou 15 andares, tinha uma bandeira da Argentina, que descia do último andar até o primeiro. A cidade toda era uma festa de bandeiras nacionais, papeis picados, camisetas com as inscrições: “Las Malvinas son argentinas”. Eu só tinha visto algo parecido aquilo, com as comemorações de conquistas de Copa do Mundo de Futebol. Ninguém queria trabalhar, ninguém queria nada com nada. Era só festa!
            O representante me recebeu, mas me informou que não seria possível marcar nenhuma entrevista naquela semana, pois todos estavam a comemorar a invasão das Ilhas Malvinas.
            (Para quem não se lembra, o governo militar argentino, para despistar o povão de lá, dos assuntos sérios,  resolveu invadir as Ilhas Falklands, no dia 2 de abril de 1982. E fez disso a maior propaganda política, na tentativa de salvar as “burrices” que haviam feito).
            Voltei ao hotel, liguei para Lan Chile, remarquei minha passagem, fiz o check-out, tomei um taxi e rumei para o aeroporto. Mas o taxista estava a fim de tirar o “sarro”. A euforia deles era tanta, que não poderiam perder oportunidade para gozar com a cara dos brasileiros. Foi logo perguntando o que eu sabia sobre a “invasão” das Malvinas. O que os brasileiros achavam. Apoiavam? Como iria reagir o Governo Brasileiro? Fez questão de lembrar que fazia 4 anos que não tinham uma festa tão grandiosa, referindo-se obviamente à conquista da Copa do Mundo de 1978, que havia sido lá. Aí eu lembrei que os argentinos morriam de inveja do nosso BNH, que nos permitia comprar a casa própria. Então perguntei se ele morava em casa própria. Ele disse que não. Sem lhe dar tempo, comecei a fazer perguntas a cerca de se comprar casas próprias por lá. Então eu disse para ele que eu tinha comprado minha casa em São Paulo e pagava menos que o valor de um aluguel, porque tínhamos o BNH, que funcionava com o dinheiro do FGTS e podíamos comprar moradia própria com muita facilidade. Ele quis confirmar que só poderia comprar casas mais modestas, ou populares.  Eu expliquei que não, que no meu caso eu comprei num bairro considerado de ricos, morava no mesmo prédio de gente com ótimo poder aquisitivo. Não sei porque lembrei – e este vou citar o nome porque ele já faleceu – do Sr. Stephen, um americano que tinha sido alto-funcionário da Marinha Mercante Americana, que era casado com uma brasileira e moravam no meu prédio. Era uma pessoa finíssima, de educação apurada e muito gentil. Eu gostava muito de conversar com ele, pois naquela época ele tinha se aposentado e era Diretor de uma Empresa de aluguel de containers e eu trabalhando com exportação, muito me interessava seus ensinamentos. Fui explicando para o taxista, que morávamos num apartamento igual, embora eu fosse um simples vendedor de cadernos escolares. Expliquei a ele quem era meu vizinho, o que tinha sido e o que fazia. Ou seja, cortei o papo dele de querer tirar o “sarro” e acabei eu tirando o “sarro” com ele, com conversa mole. Na hora que eu estava terminando de exaltar meu vizinho, chegamos ao Aeroporto, paguei, ainda de dentro do carro e desci para pegar minha mala. No que desci, estava também chegando ao Aeroporto, no taxi da frente, o próprio Sr. Stephen, que eu não fazia nem idéia de que pudesse estar na Argentina. Que coincidência! Como sempre, muito bem vestido e elegante, mostrando o porte de “gente-fina”. Não perdi oportunidade e disse ao taxista argentino:
            “ – Este é o meu vizinho, do qual lhe falei."  
O taxista não acreditava e perguntou se tínhamos marcado lá no Aeroporto. Eu disse que nem fazia idéia que ele estivesse na Argentina.  Quando o Sr. Stephen me viu, fez aquela cara de surpresa e imediatamente veio me abraçar.
            Enquanto o taxista ficou contando para o colega dele, a coincidência, entramos juntos no saguão e nos dirigimos para a Lan Chile. Ele perguntou, para onde eu ia, e quando disse Santiago, ele me olhou e disse que também ia para lá. Verificamos que era no mesmo vôo.
            Não me lembro exatamente a hora do vôo, mas quando chegamos no Aeroporto deveria ser por volta das 17:00 h.. O vôo deveria ser, portanto, por volta das 19:00 h.. Fizemos o check-in e ele me convidou para tomar um café.  Tomamos um, dois, três cafés e não chamavam nosso vôo. Fomos informados, então, que estava com atraso, mas que deveria sair por volta das 22:00 h. Para resumir embarcamos por volta de uma hora da manhã seguinte.
            Conversamos muito e ele me disse que um dos poucos países que ele não conhecia era o Chile. Alertei-o que era para tomar cuidado com a água da torneira, pois, até para escovar os dentes eu usava água mineral. Só água mineral. Pois a água de Santiago, que desce das geleiras, contem muito potássio, que causa dor de barriga. Informei a ele que sempre trazia Leiba, que era excelente para cortar a diarréia. Um santo remédio!
            Quando estávamos chegando, eu disse a ele da minha preocupação de chegar por volta das 3 ou 4 horas da manhã, não tinha como fazer câmbio no Aeroporto, eu tinha somente travel-cheques e seria difícil negociar com os taxistas. Ele me disse para não me preocupar, porque, com certeza o Gerente local da empresa dele, estaria lá à sua espera, assim ele me daria carona. De fato, quando desembarcamos lá estava o fiel gerente esperando, às quatro da manhã (vai ser puxa-saco pra lá). Ele educadamente perguntou ao gerente se poderia me dar uma carona até o hotel. Gentilmente o gerente disse claro, em qual hotel o senhor vai se hospedar. Eu disse que era no Holiday-Inn Galerias. Ora, disse ele, é o mesmo que eu reservei para o Dr. Stephen, não vai me custar nada.
            Correu tudo bem, no dia seguinte levantei um pouco mais tarde, para minhas reuniões e fiquei o dia todo fora, fui jantar com hoje amigo, mas na época gerente de compra dos Supermercados Las Brisas, nosso maior cliente no Chile. Cheguei tarde, deitei e dormi logo, porque tinha tomado uns vinhos a mais...
            Por volta das duas ou três da manhã, acordei com o telefone tocando. Atendi meio assustado, pensado, só pode ser engano. Não! Não era! Era o Sr. Stephen me perguntando se eu ainda tinha minhas Leibas, porque, não seguiu meus conselhos e tomou “só um golinho” da água da torneira. Já tinha ido ao banheiro umas três ou quatro vezes...
            Quantas coincidências seguidas!!!