Nicanor de Freitas Filho
Desde que eu era uma criança sempre ouvia, meus tios,
primos e amigos dizerem que “...o Brasil
é o país do futuro!”. Sempre acreditei nisto, pois sou otimista por natureza.
Principalmente porque, sendo muito pobre, fui internado numa excelente Escola
Agrotécnica em Muzambinho e descobri que realmente, o Brasil “era” o país do
futuro! Lá descobri que existia uma tal de Agricultura, que era a vocação do
Brasil, principalmente nos primeiros ensinamentos dos professores da área
Técnica, como Dr. Antonio Cobra, Dr. Lessa, Prof. Romário. O livro que o Dr.
Antonio adotava, de capa verde e branca, da Editora Melhoramentos, tinha na
primeira página: “O solo é a Pátria,
cultivá-lo é engrandecê-la!” E continuo acreditando nisto até hoje, pois é
isto mesmo!
Quando já era mais velho um pouco, ainda antes da
Revolução de 1964, li que o Presidente da França, Charles De Gaulle, disse: “...le Brésil n'est pas un pays sérieux.”
Note-se que o Embaixador do Brasil na França entre 1956 e 1964, Carlos Alves de
Souza, escreveu que a frase é dele e não de De Gaulle, mas ficou na história
como sendo dita por De Gaulle. Devo acreditar nisto? Será que é
isto mesmo?
Mais tarde estudei Economia, e, dentro do Curso tem uma
matéria, entre outras de igual valor, que se chama “Economia Política”. Nestes
anos de Faculdade aprendi que a intervenção do Governo na Economia, só deve
ocorrer dentro das políticas essenciais ao convívio, como Educação, Saúde,
Segurança, Relações Exteriores, Meio Ambiente e parcialmente em Transportes,
Economia (Receitas e Despesas Públicas), Previdência Social e outros. Também aprendi um pouco de Direito e nesta
área, por exemplo, que os três poderes da República, devem ser independentes e harmônicos entre si. O
que sempre entendi é que um Poder da República tem que seguir a Constituição e,
principalmente, ser independente, embora harmônico com os demais. Aprendi
também que o Poder Legislativo é bicameral, ou seja, é composto por duas
Câmaras, uma representando o povo – a dos Deputados – e outra representando os
Estados – a dos Senadores – mas que também devem ser independentes e
harmônicas. Às vezes se juntam e formam o Plenário do Congresso. E na
Constituição este fato é bem claro. E continuo acreditando nisto até hoje, pois
é isto mesmo!
Será que é isto mesmo? Sei não! Acho que fui otimista
demais! Estávamos quase chegando no “futuro”, quase sem inflação, com câmbio
flutuante, com os poderes trabalhando conforme manda a Constituição, com
independência e harmonia, numa política de “retirada” do Governo das áreas que
devem ser da iniciativa privada (telefonia, bancos, energia, estradas, aviação
etc.), quando, de repente, apareceu um populista apedeuta, que entendia muito e
tinha muita experiência em fazer as coisas, tipo assim, como são feitas nas
“centrais sindicais”, na base de negociatas, peleguismo, conchavos, enganação,
bravatas e muita mentira, bem na hora que o Mundo estava todo à nossa
disposição para fazermos as coisas corretas e nos preparar, definitivamente,
para entrarmos no Primeiro Mundo e deixarmos de ser “O País do Futuro”; mostrar
nossa seriedade e provar que De Gaulle (ou o Embaixador Carlos Souza) estava
errado. A Agricultura, que ia muito bem obrigado, foi desprezada e só se pensou
em Mineração, Pré-sal e alguns ramos empresariais e empresários premiados para
serem os campeões, sem nenhuma análise técnica correta e científica. Foi feito exatamente o que ele sabia fazer:
negociatas (BNDES), conchavos, peleguismo e muita enganação, criando um tal de
“Mensalão” e depois o “Petrolão” para comprar os políticos desonestos, que se
instalaram no Congresso e colocar nos Tribunais Superiores “amigos” que decidem
sempre de acordo com o interesse do Executivo e dos “amigos” do Legislativo,
que os apoiam! Ou seja, perdemos o bonde da história!
Depois das discussões ridículas, com o Joaquim Barbosa,
no Mensalão, o STF com novos Ministros indicados pelo Executivo e aprovados
pelos Senadores, especialmente para este fim, aceitaram a rever os julgamentos
dos “mensaleiros”, perdoando-os no que puderam. E agora, depois de mais duas ou
três indicações de novos Ministros, chegamos ao ponto de um Ministro do STF, durante
o seu voto, ao citar um artigo da Constituição, deixou de ler uma parte do
mesmo, porque, exatamente esta parte, “desdizia” o que ele estava dizendo! É
uma vergonha! E os outros Ministros foram com ele! Aliás, teve uma Ministra,
que é tão “prolixa” – e a mentira é mesmo difícil de dizer – que não conseguia esclarecer
se votava de acordo com o relator ou com o dissidente do voto do relator. Ela
falava e ninguém entendia o que ela estava votando. Até que o próprio Ministro
– que leu o artigo pela metade – lhe perguntou, claramente, se ela votava com
ele...
Meu artigo já estava escrito, hoje pela manhã, quando li,
no Estadão o artigo do ex-presidente do STF, Carlos Ayres Britto, que vou reproduzir
abaixo a parte que me interessa. Referindo-se às decisões do STF: “...mas errou, data vênia, em acumular no Senado
Federal as competências para processar e julgar o presidente da República e
ainda negar trâmite a juízo formal de admissibilidade da acusação eventualmente
feito pela Câmara dos Deputados e sem a desobediência a formalidades legais
elementares. Esquecido do advérbio de modo ‘privativamente’ que se lê
tanto no artigo constitucional definidor das competências da Câmara quanto do
Senado (cabeça dos artigos 51 e 52, respectivamente). A revelar que, na
matéria, cada qual das Casas Legislativas atua em faixa própria. O que é
privativo de uma Casa Legislativa é somente dessa Casa mesma. Não admite
compartilhamento. Pré-exclui a competência de outra para deliberar sobre o
mesmo assunto, em suma. Pouco importando que uma delas seja coloquialmente (não
positiva ou normativamente) etiquetada como Câmara Baixa e a outra como Câmara
Alta. Cada qual no seu quadrado, então, eis a decisão correta que deixou de ser
tomada e com todo o respeito é que assim me pronuncio.”
Então, “O solo não
é mais a Pátria”, o “Brasil não é
mais um país do futuro” – tem gente que já me enviou mensagem de Feliz
2019, porque 16, 17 e 18 já eram – definitivamente “...le Brésil n'est pas un pays sérieux.”
Freitas: entendo o teu estado de repulsa, angústia e raiva, e que, neste momento, me parece representar bem o sentimento da maioria dos brasileiros honrados e conscientes dos direitos e deveres com seu país. Pessoalmente, eu também gostaria de expressar o que eu sinto deste infeliz momento pelo qual esta eterna promessa de "País do Futuro", mas, como estrangeiro, devo respeitar as idiossincrasias do país que me acolhe. Devo apenas lamentar, e o faço profundamente. Dizem que as instituições seguem funcionando; mas para quem?! Abraço, e que 2016 não seja o futuro do presente. JC
ResponderExcluirJC, entendo perfeitamente sua posição e, principalmente, o seu apoio! Estou com mais esperança na Justiça do seu País do que na do nosso. Talvez ainda sejamos beneficiados por atitudes das autoridades portuguesas... Quem sabe?
ExcluirParabéns Nica, você, como sempre, a fazer suas análises e comentários precisos, tão precisos que nos dá vontade de repetir a famosa frase: FAÇO MINHAS AS PALAVRAS DO AMIGO. Continue firme querido primo. Você é um perfeito modelo de brasilidade. J.P.Freitas
ResponderExcluirZé Pedro, brasilidade sim, pode contar comigo, o problema é que não estou mais acreditando nas tais das "Instituições"...
ExcluirPois é, Nicanor. Como sou da mesma geração do "Brasil país do futuro", fico com a mesma impressão. Está corretíssimo o ex-Ministro do STF Ayres de Britto. Na verdade compete "privativamente" à Câmara atuar como órgão que autoriza a abertura do processo de "impeachment" e até acusatório. Ou seja, por 2/3 decidir que a presidente da república, em tese, praticou crime de responsabilidade (art. 51, I, da CF). Já ao Senado compete atuar como "juiz", ou seja, acolhendo a "denúncia" da Câmara (art. 52, I da CF) e sob a direção do presidente do STF, dar início ao processo. O que o STF fez, na verdade, foi misturar "alhos com bugalhos". Isto é, admitir que também ao Senado competiria indeferir a acusação. E, ingênuo eu, por quê será, não? Ora, porque embora na Câmara possa haver a autorização para a abertura do processo (o que eu duvido), no Senado os "aliados" da presidente têm maioria absoluta, o que redundará na improcedência da acusação! Se me derem a honra visitem o meu "blog" - jurisconsumo & tal, onde também dou os meus "pitacos".
ResponderExcluirDr. Filomeno, acho que se tornaram "bugalhos" e se misturaram com os outros "bugalhos", tornando-se todos numa "bugalheira" só!
ExcluirDeixei lá no seu blog meus comentários, sobre os seus esclarecedores "pitacos"...
Tio Nica, como brasileiro e servidor do Poder Judiciário me envergonho ainda mais das "lambanças" que o STF tem protagonizado. A divergência técnica deu lugar para o arranjo amigo, omissão companheira, voto pelego, etc. Quando o "guardião" da Constituição desfalece, pouca esperança sobra para o nosso "País do futuro".
ResponderExcluirQuando um Poder da República acha melhor agradar o poder que lhe indica, ao invés de seguir, rigorosa e tecnicamente a Constituição, é porque já se danou tudo!! Tenho estado muito pessimista ultimamente...
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