“É uma coisa esquecida. Significa ‘criar
laços’...”
Antoine de Saint-Exupéry
Nicanor de Freitas Filho
Dia destes, estava levando meu neto ao Clube, onde ele
faz alguns esportes. Nesse dia, estávamos só nós dois no carro. Ele se queixou
de dois colegas do Clube. Um deles é muito bonzinho, embora meio
“gozador”. Então eu tentava explicar
para ele que, para se ter amigos de verdade, é preciso de cativá-los. Ele, dos
seus 8 anos perguntou: “O que é cativá-los?”
Comecei dizendo que cativar é respeitar e se fazer
respeitar, é saber dividir as coisas boas de forma que todos saiam ganhando, é
fazer o que os outros gostam mas fazer com que eles façam o que a gente também
gosta... Ele me interrompeu: “Vovô, vamos falar de futebol? Isto está
muito difícil!” Na hora eu me calei e naqueles
minutos que ficamos pensando sobre o que conversar, eu fiquei decepcionado, por
não saber explicar ao meu neto o que é cativar. Veio então uma vaga lembrança
de uns 55 ou 60 anos atrás, quando li “O Pequeno Príncipe” de Antoine de
Saint-Exupéry, que muito me marcou. Refiro-me à conversa do Pequeno Príncipe
com a Raposa, que explicou claramente para ele o que era “cativar”. Mas não
consegui, naquele momento, me lembrar exatamente da explicação da Raposa. Então
passamos a falar de futebol e como ele tem boa memória, sabe a classificação,
saldo de gols, número de vitórias e muitas outros dados importantes sobre os
times, a conversa sempre flui. Então, de repente, ele disse: “Você viu
quem é o novo Técnico do São Paulo? É o Doriva. Ficou na Ponte Preta só uns
dois meses...Vovô, já foram mais de 25 Técnicos trocados e só tem 20 times no
Brasileirão! Não é engraçado?”
Aí, então eu disse para ele: “Os Técnicos não
sabem cativar, os Diretores dos Clubes também não sabem... Todos deveriam saber
cativar os jogadores, a torcida, os Diretores e os Técnicos... Deu para
entender o que é ‘cativar’?” Ele respondeu: “Não
Vovô, o que os Técnicos fazem é o normal, perde tem que sair...” Pensei, meu Deus, como essa Imprensa trata o assunto
tão vulgarmente e naturalmente, que na cabecinha dele é normal trocar de
Técnico, quando perde! Que pena! Poderia entender tudo isto de outra forma, mas
infelizmente foi assim que ele aprendeu.
Chegando em casa, fui procurar na estante “O Pequeno
Príncipe” e fui direto para o encontro do Príncipe com a Raposa. Curiosamente
ele faz a mesma pergunta várias vezes à Raposa: “Que quer dizer
‘cativar’?”Como o meu neto a fez. A Raposa,
muito mais esperta que eu, depois de várias pequenas explicações finaliza
dizendo que “É uma coisa esquecida. Significa ‘criar laços...’...Tu não
és ainda para mim senão um garoto inteiramente igual a cem mil outros
garotos.Eu não tenho necessidade de ti. E tu não tens também necessidade de
mim. Não passo a teus olhos de uma raposa igual a cem mil outras raposas. Mas
se tu me cativas, nós teremos necessidade um do outro. Serás para mim único no
mundo. E eu serei para ti única no mundo...conhecerei um barulho de passos que
será diferente dos outros. Outros passos me fazem entrar debaixo da terra. O
teu me chamará para fora da toca, como se fosse música...Se tu vens, por
exemplo, às quatro da tarde, desde às três eu começarei a ser feliz...” E finalmente, depois de cativada, conta-lhe o
segredo: “...só se vê bem com o coração. O essencial é invisível aos
olhos... Foi o tempo que perdeste com tua rosa que fez tua rosa tão
importante... Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas.”
Então eu li o capítulo, de onde tirei os trechos acima,
para ele, no dia seguinte, que curiosamente ele aquietou-se para ouvir. Quando
terminei, perguntei se queria ler o resto, claro que ele disse que não, pois já
estava cansado de ouvir-me. Ele então se aconchegou, colocou o braço sobre o
meu ombro e disse: “Agora eu sei. É só te fazer uns carinhos e obedecer
direitinho, que a gente te cativa...”
Falar o
que?
Freitas:
ResponderExcluirConfesso que de princípio, achei o texto um tanto longo, mas comecei a ler e acabei percebendo que fiquei "cativado" com a história. Muito bom, parabéns. Grande abraço, Edson
Atingi o meu objetivo! Oba!
ExcluirFreitas, nada melhor que esses momentos mágicos, vividos entre pais, filhos e netos, para cativar a essência da felicidade familiar. Nós também somos responsáveis por ela. - Abraço - JC
ResponderExcluirEu tenho passado cada uma com os dois netos, que não é fácil...
ExcluirAbraço