Nicanor de Freitas Filho
Na década de 70 eu trabalhei num Grupo Financeiro, que
era formado por 12 empresas dos mais diversos ramos. Na época eu era Diretor
Financeiro de uma rede de lojas de eletrodomésticos. Ela tinha sido adquirida
da Associação de Funcionários do Estado de S. Paulo e, portanto, já veio com
muitos clientes. Resolveu-se que, para recapitalizar a empresa o melhor seria
abrir o seu capital e mesmo que não tivesse entrada na Bolsa de Valores,
poderíamos operar balcão, que na época era muito mais comum, que hoje. Desde
que pagasse dividendos, você conseguia vender ações em balcão.
Para abrir o capital tinha uma série de atos
burocráticos, junto à Receita Federal, ao Banco Central, à Secretaria de
Finanças e várias outras repartições. Fui escalado para ir a Brasília, para
agilizar os trâmites junto ao Banco Central, onde o Presidente do Grupo tinha
um parente que poderia nos ajudar. Junto comigo foi um ex-funcionário do Banco
Central, que estava aguardando a legalização da filial paulista de um banco
mineiro, recém adquirido pelo Grupo que eu trabalhava, para ser diretor.
Conhecia bastante a burocracia do BC.
O Avião em que fomos para Brasília, um Boeing 737 da
Vasp, fazia escala em Goiânia. Ao aterrissar lá, teve o para-brisa trincado.
Não tinha outro avião para nos levar nem como consertá-lo naquele dia. Não se
conseguiu ônibus suficiente para levar todos os passageiros. Assim, os que não
couberam no ônibus, foram colocados de 4 em 4 em taxis. E foi num desses taxis
que chegamos a Brasília, já muito tarde, pois esta viagem, naquela época,
gastava-se umas duas horas.
Ficamos no hotel, que na época era o melhor de Brasília,
onde ficavam políticos e autoridades. Afinal precisávamos demonstrar capacidade
financeira, para impressionar as “autoridades”! De cara, ao chegar no meu
quarto, o Bell-capitan, me explicou como funcionavam banheiro, ar condicionado
etc. e me entregou um “catálogo” de manequins disponíveis para “acompanhantes”,
com as fotos e o preço de cada uma. Tinham manequins famosas, artistas de TV –
inclusive da Globo – que na época já se despontava como “noveleira” e incluía
até “algumas famosas”, aliás muito disputadas, segundo me informou o
Bell-capitan. Esclareceu que se eu quisesse duas, seria bom consultar para
saber se elas se conheciam e tinham relacionamento, porque havia acontecido de
um empresário escolher duas que não se bicavam e foi uma confusão danada.
Fiquei imaginando do quê, que eu tinha cara. De político influente, de grande e
rico empresário ou de tarado mesmo! Pelo que ele insistiu – talvez pensando na
comissão – não foi brincadeira. Eu que sempre fui honesto e estava somente
trabalhando, cheguei a ficar indignado, mas aí pensei comigo: - é só não fazer
nada! Pronto! Apreciei o álbum e deixei-o por lá.
Mas não é sobre isso que quero falar. É do funcionário do
BC, parente do meu chefe. Ele foi nos pegar no Hotel, onde tomou o café da
manhã conosco e fomos para o prédio do BC. Assim que chegamos ele passou na
sala dele e a Secretária lhe disse que “fulano” veio lhe procurar. Ele disse OK
e saiu conosco, para irmos pegar uma certidão que nos faltava. Voltamos depois
de umas duas horas e novamente a Secretária lhe disse que o fulano veio lhe
procurar. Ele disse que tudo bem e saímos para almoçar. Voltamos do almoço e
novamente a Secretária lhe disse que o fulano veio lhe procurar. Ele disse que
tudo bem. Então a Secretária lhe perguntou se ela não poderia resolver o
problema para ele. Ele disse: “-Claro que não, ele quer me pagar uma
grana que emprestei para ele no mês passado.”
Ela falou: “-diz quanto é e onde devo depositar que eu pego quando ele
voltar.” Ele retrucou: “-É doida? Eu
tenho que pedir um favor para ele, para resolver o assunto dos meus amigos
aqui, e, quero que ele esteja me devendo, na hora que eu pedir o favor, para
ele não ter como dizer não! Entendeu?”
“-Ahhhh! Bom! Entendido...”
Pensa que este “serviço de consultoria” (peço autorização
para usar o termo, criado pelos atuais políticos do PT) ficou por conta de
amizade familiar? Não! Ele se licenciou do BC e foi ser Diretor do Banco
adquirido pelo Grupo.
Freitas
ResponderExcluirImagina você que, nessa época dos militares, os "favores" eram bem mais difíceis, e muito menos visíveis. Hoje, Brasília é muito
mais "generosa", e os "favores" cresceram exponencialmente. E quem não precisar, ou se ofender com eles, não entra na "Grande Família", com perdão à da Globo. Abraço.
José Carlos - 15/08/12
Zé, Brasilia tem nos mostrado como sempre foram as coisas por lá, principalmente agora neste julgamento do Mensalão, pela primeira vez na vida, vi um "Juiz" (Ministro), fazer uma defesa tão bem feita, que nenhum advogado de defesa conseguiu fazer. E não adianta nos indignarmos, porque ele tem o cargo (que é vitalício) e o direito ao voto! Pior, será o novo Vice-Presidente do STF e portanto em breve o Presidente.
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