sábado, 15 de dezembro de 2012

Causo 74 Os Apelidos na Agrotécnica



Alfredo Francisco José Soja
            No início do ano, os novos alunos, quase todos, ou talvez mesmo todos, recebiam um apelido. Se o apelido pegava, quase ninguém aprendia o nome do colega. Quem escapava, raramente, em época posterior, era apelidado.
            Às vezes o apelido era herdado... Um colega, baixinho, tinha o apelido de “Paquito”. Formou-se, saiu da Escola. No ano seguinte, um dos novos alunos, também baixinho, não escapou: ficou sendo “Paquito”, mesmo sem nem sequer conhecer o “xará”.
            Também acontecia o caso de um irmão (ou outro colega) receber o apelido no diminutivo: havia o “Bambu” e seu irmão era o “Bambuzinho”, “Ximbicão” e “Ximbiquinha”, “Surtico” e “Surtão”, “Galã” e “Galãzinho”, havia o “Cabide” e o “Cabidinho” (estes não eram irmãos).
            Muitos apelidos eram nomes de animais: “Boi”, “Ganso”, “Lagarto”, “Tatu”, “Grilo”, “Cão”, “Tucano”, “Formiga”, “Lagartixa”, “Rato”, “Sapo” (que passou por um episódio edificante o qual vou contar adiante), “Ratinho”, “Gambá”, “Gato”, “Zé Macaca”, “Mula”, “Rato Magro”, “Leãozinho”, “Burro Preto”, “Quati”, “Manjuba”, “Mutuca”, “Frango”, “Cachorro Louco”, “Marreco”, etc. Este último viera de outra escola agrícola, onde tinha o apelido “Capão” e até as meninas da cidade assim o chamavam, segundo ele mesmo contou. Quando mudou para nossa Escola, não queria que o antigo apelido vingasse também no novo ambiente. Armou um plano: iria brigar com o primeiro que tentasse dar-lhe um apelido bonito ou, ao menos, não pejorativo... Seu plano deu certo: quando o “Chocolate” o chamou de “Marreco”, ele armou um bate-boca, o novo apelido pegou e ele livrou-se da velha alcunha que não o agradava.
            Alguns apelidos eram um tanto genéricos: “Mineiro”, por exemplo, atribuído a quase todos oriundos do Estado vizinho. Mas, havia o “Mineirão” e o “Mineirinho”. De um modo geral eram chamados de “Bodes” todos os que tinham sangue japonês (e havia muitos na Escola naquele tempo). Os “Biscoitos” eram os holandeses. Havia, é claro, o “Baiano”, o “Barriga Verde”, o “Baianinho”. Outros eram conhecidos pelo nome do lugar de onde vieram: “Borda”, por vir de Borda da Mata, “Campestrinho” por ser de Campestre, ambas cidades de Minas, também “Santista”, “Santistão”, “Paulista”, “Tietê”, “Itapira”, “Cataguá”, etc.  Houve também um “Tcheco” e um “Alemão” ambos verdadeiramente oriundos daqueles países.
            De uma maneira geral, todos aceitavam seus apelidos, mesmo depois de formados, mas, segundo me contam, o “Formigão” não admite que algum antigo colega o chame assim... O azar é dele: ninguém vai esquecer seu nome de guerra.
            Lembro de colegas que tinham dois apelidos e atendiam pelos dois: um era “Ponce” e “João Vermeio”, outro “Gudum” e “Carioca”, outro “Itapetininga” e “Nicão”, outro “Levindo” e “Pacheco”, outro ainda “Duque” e “Brodósqui”.
            Certamente não vou lembrar todos, mas ainda me ocorrem: “Vô”, “Butinão”, “Gordo” (e nem era tão gordo), “Teco”, “Bola Quatro”, “Bola Sete”, “Pernalonga”, “Véio”, “Juru Poca”, “Sorveteiro” (sua namorada era filha do dono da sorveteria), “Fu Manchu”, “Feijão” (fez um discurso sobre o valor do feijão...), “Dudu”, “Barão”, “Chucrute”, “Boiadeiro”, “Pulim”, “Banquiva”, “Pinga”, “Mixirica”, “Turco”, “Dutrinha”, “Soneca” (não sei se era dorminhoco...), “Torrada” e “Goioba” (estes dois muito bons na fanfarra da Escola), “Chinesinho”, “Chocolate” (na primeira vez em que chegou na Escola veio vestido de marrom...), “Pito”, “Padreco”, “ Cabelo” (êta sanfoneiro!), “Chimbrinha”, “Ceguinho”, “Português”(haviam dois), “Morto”, “Ponto Morto”,”Hy-Fy” (ou “Rai-Fai”), “Goianinho” (protagonista de um episódio famoso, anterior ao meu tempo), “Kim”, “Picão” (era alto e magro), “Xepa”, “Taquara”, “Currupaco”, “Nhapeva” (em língua indígena peva seria pequeno, coisa que aprendi muito mais tarde) “Paineirinha”, “Gualicho”. Este último é um “causo” que merece ser contado: em uma corrida de cavalos famosa, acho que se chamava “Grande Prêmio Brasil”, ganhou um animal com o nome de Gualicho. Ora, alguém tinha que pegar este apelido. O cavalo em questão tinha uma bela crina, logo, um colega que era topetudo, tinha um vistoso cabelo, ficou sendo o próprio...
            Acontecia de alguns terem pequena adaptação do próprio nome: “Miltinho”, “Zé...”(diversos), “Lucinho”, “Robertão”, “Benê”, “Chico”, “Bifão”, “Lelo”, “Rui Bocudo”, “Mané Expressinho”, “Mané Chofer de Praça”, “Dito Calça Curta”, “Lelei”, “Ailton Louco”, “Tomitinha”, “Tosinho”, “Mor” (porque apareceu com as iniciais do nome bordadas na sua camisa), “Faé”,  “João Galinha” (gostava do aviário...), etc.
            Afinal, um apelido talvez signifique um “status” de pessoa aceita entre seus colegas, talvez dê um certo ar de familiaridade, intimidade ou coleguismo.

5 comentários:

  1. Freitas/Alfredo
    Freitas: ou teu amigo Alfredo tem uma memória privilegiadíssima, ou tem um arquivo ainda mais organizado que o seu, o que é bastante difícil. Eu não consigo nem sequer lembrar de nenhum de meus apelidos, além de "Zé". Alfredo, você tem razão ao definir o apelido como o reconhecimento de "status" no grupo. O nome próprio passa a ser um anônimo qualquer, e é o apelido que lhe confere individualidade e destaque entre os amigos. Pelo seu sobrenome, acho que você é o "Tcheco". Parabéns pela interessante e original abordagem. Abraços - José Carlos - 15/12/12

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    1. Além de ter memória privilegiada, o Soja tem um arquivo, que acredito, melhor que o da Escola, pois está sempre atualizado. Estou só esperando para ver se algum desses colegas vai se manifestar...

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  2. Caro Freitas:
    Não o "Tcheco" era outro colega, cujo destino ignoramos. Abs. Soja

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    1. Soja, agora você me passou vergonha!!! Aquela sua tia que eu conheci não era Tcheca? Então esclareça aí qual sua descendência, para o pessoal ver que errei por pouco...rsrsrs

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    2. Nicanor,
      Sim, minha tia, minha mãe, etc. eram tchecas. Eu sou descendente de tchecos. Mas, na Escola havia um colega, que se formou em 1960, que tinha o apelido de "Tcheco". Na Escola, portanto, o "Tcheco" não era eu. Aliás, o próprio era realmente nascido lá e eu sou nascido aqui. Eu entrei em 1960 e convivemos só por um ano, mas não fomos muito próximos: cada um tinha a sua turma.

      Abs.
      Soja

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Nicanor de Freitas Filho