terça-feira, 13 de junho de 2017

Ah! Se fosse hoje!

Nicanor de Freitas Filho

            Em 12/06/2007, portanto há dez anos, como já contei aqui, sofri um infarto do miocárdio, seguido de uma parada cardiorrespiratória que resultou na colocação de quatro stents, em três angioplastias e, realmente, foi o que me fez parar de trabalhar no mercado gráfico-editorial, em que eu estava havia cerca de 30 anos. Em decorrência desse fato, recebi muitas visitas de amigos, em minha casa, que na época era no Edifício Isabel de Castela na Rua Haddock Lobo.
            Uma dessas visitas foi do casal amigo, Glória e Pedro, que moram no Rio de Janeiro. Estando em São Paulo, foram em casa me visitar. Ficamos conversando até por volta das 22:30 h e eles iam dormir na casa de uns primos que moram em Perdizes. Minha mulher disse que íamos levá-los, pois já era um pouco tarde. Eu não estava dirigindo, então ela que teria que ir dirigindo. Como todo casal de paulistanos, já que era minha mulher que estava dirigindo, foram no banco da frente ela e Glória. O Pedro e eu sentamos no banco de traseiro.
            Como moramos lá por 33 anos e nossa vaga de garagem nunca mudou, ficava bem atrás do elevador, de forma que saíamos e dirigíamos ao carro sem mesmo ver o resto da garagem, e a gente fazia a manobra de ré, para pegar a saída do portão, quase que sem olhar. Só tinha que ter cuidado com um pilar que fica à esquerda de quem está dirigindo de ré. Entramos no carro que era beije, e ainda conversando ela manobrou normalmente até que viu o pilar passar e nesse momento escutamos um barulho de raspar. Ela imediatamente freou o carro e não sabemos como, estava parado, fora das vagas, à esquerda dela, um carro preto, acredito que era uma Tucson, quase no vão da saída. Não tinha a mínima lógica aquele carro parado ali. Pensamos que era um visitante ou alguém que foi buscar algum morador, pois não conhecíamos o senhor parado ao lado do carro preto.
            Minha mulher desceu, desculpou-se, mas perguntou porque ele estava parado ali, no caminho de saída. Ele, de terno e gravata, foi de uma grossura com ela, dizendo que não lhe devia satisfação, era morador do prédio e estava aguardando a mulher dele que havia subido por ter esquecido algo. Mas disse isto de maneira grosseira e agressiva! Então imediatamente descemos, meu amigo e eu.  Já me coloquei à frente dele e a primeira coisa que fiz, foi olhar o tamanho do estrago. Não tinha acontecido nada, pois ela estava manobrando muito devagar. Apenas ficou uma marquinha beije, no pára-choque preto dele. Ele, de maneira muito agressiva, perguntou se morávamos no prédio, e eu respondi que só há 33 anos! E também já perguntei de qual unidade ele era morador. Ele disse novamente, que não devia satisfação. Então agachei e passei a mão sobre o pára-choque dele e saiu toda a marca na minha mão. Não ficou nada. Mas mesmo assim ele disse que ia fazer uma “ocorrência”! Oi? Ocorrência? Sim! “Vou chamar o zelador e vou fazer a ocorrência.” Eu fui bem claro com ele. “O Zelador esta hora está dormindo, porque levanta muito cedo. Dei o número do meu  apartamento e disse que  poderíamos conversar na manhã seguinte.” “Não! Vou chamá-lo.” Foi até ao interfone e mandou chamar o pobre Zelador, que além de tudo é muito meu amigo, pois eu fui o segundo morador do prédio, tinha sido Síndico duas vezes, sempre fui do Conselho Deliberativo, inclusive eu, junto com Dr. Ari, quem escrevemos o Regimento Interno definitivo do Prédio.
            O Zelador chegou, nitidamente com sono, de forma que dava para saber que ele foi acordado – nessas alturas já passava das 23:00 h – e o doutor de gravata já foi falando que... “esta senhora bateu no meu carro. Manobrou de forma perigosa e distraída. Queria fazer uma ocorrência para tomar as devidas providências.” O Zelador olhou no carro dele, onde já não tinha mais nada e perguntou onde bateu. Ele apontou o pára-choque  e o Zelador agachando e chegando bem perto, riu e disse que aquilo não era “batida”. Dirigiu-se ao container de lixo, pegou um pano, foi até à torneira molhou e passou com força sobre a grande “batida”.  Aí desapareceu de tudo mesmo!
            O doutor de gravata porém disse para o Zelador anotar no livro de ocorrências, porque ele iria tomar as providências. Repetiu isso umas três ou quatro vezes, nitidamente querendo nos intimidar. Eu então, disse, que se ele quisesse conversar no outro dia, estaria em casa o dia todo. Ele, sempre com muita grosseria e arrogância, disse que tomaria as providências. “OK! O senhor, por gentileza,  pode afastar seu carro para sairmos, pois temos que levar nossas visitas?” Ele com toda a arrogância e má vontade, afastou o carro. Entramos e nos fomos. Nem me preocupei, pois realmente não tinha acontecido nada.
            No dia seguinte, procurei o Zelador para saber como ele iria “registrar a ocorrência” e ele me disse para não me preocupar, pois não ficou nenhuma marca e que ela já tinha conversado com o doutor e lhe explicou que não tinha livro de ocorrência. Disse para eu só ficar de olho, porque ele ainda repetiu que ia tomar providências. Talvez vá até alguma delegacia, fazer um BO, pois além de tudo ele é advogado.
            Nessa época morava lá no nosso prédio o Fábio Luis, o Lulinha, e tinha uma amiga dele, que segundo me informaram, era a filha daquele camarada que emprestava a casa para o Lula morar, antes dele “comprar” o apartamento em São Bernardo. Ela que tinha alugado lá primeiro e depois arranjou uma unidade para o Lulinha alugar. Aliás, diga-se, várias vezes encontrei com o Lulinha no elevador, sempre educado e cordial. Cumprimentava, abria a porta para as senhoras e os mais velhos. Nada a ver com a imagem que temos do pai.
            Passados dez anos, que mudei-me de lá, hoje moro bem perto e sempre vou lá, e os funcionários ainda são os mesmos, inclusive o Zelador. São meus amigos, falamos de futebol, pois são três corinthianos e um sãopaulino. Não é que o Zelador me disse, recentemente, que sempre que vê os depoimentos da Lava Jato na televisão lembra-se de mim, da falta de educação daquele doutor que certa vez encostamos no pára-choque do carro dele. Eu nunca tinha me dado conta, mesmo porque não prestei a mínima atenção no mal educado, mas trata-se de (momento marcante) Cristiano Zanin, advogado do Lula. Pode? Ah! Se fosse hoje!

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Nicanor de Freitas Filho