quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

Causo 90 Deus Sempre ajuda...

(parte 2)
... a nós, compete acreditar!

Nicanor de Freitas Filho
Estava começando a Copa do Mundo de 1974. Sofri um violento acidente, no banheiro, dentro de casa, conforme já contei na primeira parte deste causo, que me deixou o tórax enfaixado e sem movimento no braço direito.
Como naquele tempo ainda participavam somente 16 seleções, já começava a Copa, como oitavas de final. Assim os jogos eram sempre aos sábados e domingos e quartas e quintas-feiras. Desta forma resolvi marcar, para trocar as faixas, sempre às quartas-feiras, porque no dia da troca eu não ia trabalhar e assim podia assistir aos jogos da Copa. Embora não empolgasse muito a retranca brasileira, tínhamos bons jogadores, como Leão, Nelinho (o maior batedor de faltas que conheci), Luis Pereira, Piazza, Rivelino, Paulo Cesar, Jairzinho e muitos outros bons jogadores. E sempre se tinha a esperança do tetra.
            Fiquei durante 60 dias trocando semanalmente as faixas. Nesse período, foi uma dificuldade, não no trabalho, pois minhas funções me permitiam apenas participar de reuniões e tínhamos boas secretárias, e um colega, também economista, com o qual tinha uma sintonia de trabalho muito boa, mas para fazer as coisas rotineiras sem a mão direita. Por exemplo, minha mulher tinha que assinar um cheque que eu sacava e carregava tudo em dinheiro vivo, pois não tinha como assinar cheques. Naquele tempo não se usavam os cartões de crédito. Sem poder dirigir, geralmente eu ia trabalhar de taxi.
            Nessa época tinha um colega que namorava a cunhada de um dos diretores da Financeira que eu trabalhava, que morava em Pinheiros, se não me engano na Rua Padre Carvalho, bem atrás da Av. Pedroso de Morais, ou seja, pro lado da minha casa, que ficava na Rua Alves Guimarães. Então, algumas vezes, quando ele ia namorar e eu de volta para casa, rachávamos o taxi, isto é, cada um pagava metade da corrida. Como eu parava primeiro, ele pagava a corrida e no dia seguinte me dizia quanto foi e eu lhe reembolsava a metade do valor.
            Era moda, e muito comum, os homens usarem uma “capanguinha” com uma alça pequena, para carregar dinheiro, documentos, isqueiro, cigarro e outros objetos. Era assim, parecida com uma nécessaire, mas geralmente de couro e tinha algumas bonitas. Eu usava uma de couro marrom, não muito grande, mas “quebrava o galho”, pois era a única coisa que conseguia carregar com a mão esquerda. Nesse dia, que vou relatar, eu tinha comprado um par de sapatos e então estava com minha capanguinha e uma caixa de sapatos. Convidei meu colega para rachar o taxi, e fomos, por volta das 18:30 h. Aquele rush danado! Fomos conversando sobre futebol, sobre a Copa do Mundo até minha casa. O taxi parou bem na porta do meu prédio, despedi-me do amigo, peguei a caixa de sapatos e desci do taxi. Assim que entrei no saguão, notei que faltava a capanguinha, onde estava a chave de casa. Imediatamente, perguntei pelo zelador, que era um bom motorista e poderia me ajudar, dirigindo o meu carro. O porteiro me informou que ele tinha saído. Joguei então a caixa de sapatos sobre a mesa do porteiro, disse para ele guardar para mim. Saí para rua, dei de cara com uma vizinha chegando de taxi, que tomei imediatamente, e disse ao motorista para descer a Rua Cardeal Arcoverde até à Av. Pedroso de Morais, que deveria ser o caminho que meu amigo fazia. Aí fui explicar a ele o que tinha acontecido e de que forma poderia me ajudar, para encontrarmos o taxi, onde havia esquecido minha capanguinha. Sabia que o taxi era um Opala marrom, embora não soubesse a placa. Não havia ainda padronização de cores de taxi, como hoje. Mas Opala marrom não era muito comum. Descemos a Rua Cardeal Arcoverde e eu de olho nos carros. Entramos à direita na Av. Pedroso e o trânsito estava intenso. O motorista me dizia: “-Moço, não tem como encontrarmos um taxi, com tantos carros passando.” Eu insistia para ele ir em direção a Rua Padre Carvalho, quando, de repente, vi, no sentido contrário um taxi marrom. Desci no meio do trânsito mesmo e tentei correr atrás. Mas com todo o movimento não foi possível. Então fiz sinal para o motorista do meu taxi fazer o balão para voltarmos. Ele titubeou e então levantei o braço esquerdo e parei o trânsito para ele fazer a conversão. Algumas buzinadas e alguns xingamentos, entrei no taxi e disse para ele seguir o marronzinho. Ele tentava ultrapassar para aproximarmos, mas ninguém ajudava. Estávamos a uns 10 carros de distância do marronzinho, quando ele ficou parado no semáforo da esquina da rua Teodoro Sampaio. Nós estávamos parados um pouco pra frente da esquina com a Rua Cardeal Arcoverde, isto é, menos de um quarteirão atrás. Eu disse para o motorista que ia descer e correr até lá, se por acaso eu não conseguisse, ele deveria me pegar lá na frente. Na hora que eu estava chegando, o semáforo abriu – o marronzinho era o segundo carro – e ele chegou a movimentar, mas eu consegui bater com a mão esquerda no porta-malas, o que fez um tremendo barulho e ele parou para ver o que tinha acontecido. Imagino que ele pensou que alguém lhe tivesse abalroado por traz. No que ele parou, corri e abri a porta traseira da esquerda, enfiei a mão e peguei minha capanguinha que lá estava e disse para ele: “-Pode ir que já peguei minha capanguinha.” Acho que ele não entendeu nada, mas como os motoristas que estavam atrás, começaram a buzinar, ele se mandou e eu fiquei esperando pelo meu taxi, com minha capanguinha na mão.  Quando o motorista parou para eu entrar novamente no taxi, ele não acreditava! “-Mas como o senhor sabia que era esse taxi que o senhor tinha tomado?” Eu, já sentado e mais calmo, porque dentro da capanguinha tinha uma bolada de dinheiro, respondi para ele: “-Foi Deus quem me informou...”

6 comentários:

  1. Olá Nicanor, você tem sorte. Acredito que foi obra do destino para compensá-lo pela dor que sentiu quando quebrou o braço no banheiro. Abraços - Wanderley Ciuffi

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    1. Muito obrigado Wanderley! Como eu disse: "Deus sempre ajuda...compete a nós acreditar". Fico imaginando hoje, 40 anos depois, eu parando o trânsito na Av. Pedroso de Morais, seria linchado!

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  2. Freitas
    A história completa não é mais um causo. É um verdadeiro THRILLER, com um final feliz e surpreendente. Abraço. J. Carlos

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    1. É verdade Zé! Estes textos fazem parte de minhas "Memórias", que tenho tentado colocar "no computador", já que nem sei escrever mais, pelar colocar no Papel. Nem cheque a gente assina mais... acho que não dou mais conta de escrever uma página à mão... Obrigado pelos comentários!

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  3. Coisas de DESTINO... (VLM - Maria Arteira)

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Nicanor de Freitas Filho