Regina Célia Mastine
Em dezembro de 1956, eu estava com apenas
seis anos, quando minha querida tia Nenzinha chegou em nossa casa em Itajubá,
no sul de Minas; juntamente com seu marido o Tio Osvaldo, vieram de charrete para passar o dia
conosco e fazer suas compras, pois em sua cidade, São José do Alegre, na
ocasião, não havia tantos estabelecimentos comerciais.
Minha mãe ficava feliz em receber sua
irmã tão querida e caprichava mais ainda na decoração dos pratos apetitosos que
fazia para nossa mesa de refeições.
Durante o almoço a tia Nenzinha
convidou-me para passar as férias com eles, e era a primeira vez que iria
viajar sem estar acompanhada de minhas irmãs. Eu fiquei empolgada e como
gostava de andar de charrete, de imediato fiquei pedindo por várias vezes para
que mamãe permitisse. Consegui a autorização de tanto insistir para ir... Feliz
fui fazer minha malinha juntamente com a Joaquina, nossa aia, que sempre estava
alegre e prestativa e nos ajudava em todos os serviços da casa .
Mas ao despedir de minhas irmãs, senti
que a Zélia queria ir também. Ela estava com dez anos nessa ocasião, mas não
havia lugar no único banco que a charrete possuía e ela ficou com os olhos
lacrimejantes... Fui...
Sendo eu a caçula de minha casa a Tia
Nenzinha me agradava mais, pois ela não tinha filhos, me ensinou a fazer crochê,
tricô, renda turca e bordar. Encontrei com meus primos que moravam ao lado, filhos
de um irmão da mamãe, brincamos bastante pois éramos quase da mesma faixa de
idade. Uma das brincadeiras que mais marcou foi em cima de uma enorme
mangueira, onde eu, Tereza Maria e Marcinha, com nossas mobilhinhas,
brincávamos de casinha, nos galhos grossos, os quais imaginávamos o andar do
nosso prédio que era a árvore. Eu ficava no mais alto galho me sentindo como se
estivesse naqueles edifícios que não existiam em Itajubá e nem em São José do
Alegre. Pela manhã íamos ao curral com o primo Conrado, e cada uma levava
sua canequinha branca de ágata, com uma
pitada de sal dentro, para tomar com o leite tirado direto da vaca à caneca;
que espuminhas deliciosas formavam com o jato do leite, coisa difícil de ver
atualmente devido as fabulosas máquinas que substituíram as mãos habilidosas de
quem sabe ordenhar.
Nesta ocasião começou a chover muito
naquela região e o rio Sapucaí começou a subir, subir, transbordou e levou a
única ponte existente. Ficamos ilhados! Estava aproximando o dia de meu
aniversário e o Natal... A chuva não parava, não tendo como voltar antes do dia
22 de dezembro para Itajubá, eu chorava muito em ter que passar pela primeira
vez, meu aniversário longe de minha mãe, minhas irmãs e amiguinhas; chorava
mais ainda quando pensava no Natal diferente que teria que passar...
Para amenizar a situação a Tia Nenzinha
estava programando a minha festa, e euforicamente preparava os docinhos, os
salgadinhos e o bolo para o meu aniversário. Ela estava feliz, pois era a
primeira vez que fazia festa de aniversário de criança naquela casa enorme...
Chegou o dia 22 e ela fez tanta coisa gostosa para me proporcionar alegria. Convidou
tanta gente estranha que eu nem conhecia, muitos adultos, seus amigos estavam
compartilhando da alegria da tia Nenzinha, em fazer minha festa de aniversário;
até o Páraco da Igreja São José. Como eu não conseguia parar de chorar, o Padre
Gervásio ficou comovido com o meu pranto e na hora do parabéns, as lágrimas
eram tantas, eu soluçando, não sabia disfarçar para conter as lágrimas ao
cortar aquele bolo alto, cheio de camadas quadriculadas feito um tabuleiro de
damas, com chocolate e massa branca e preta. Vi várias pessoas chorando
também... Que tristeza não poder voltar para Itajubá por que a ponte caiu!
Mais lágrimas caiam quando comentavam
que eu teria que passar o Natal lá. Felizmente o Padre Gervásio teve uma
brilhante idéia, eu o escutei falando para o tio Osvaldo que sabia uma solução,
para resolver a tristeza da Regininha: “- Se você doar uma leitoa para a
ceia de Natal aos Padres de Itajubá...” Ele
telefonaria para o Padre Mário (de Itajubá) vir até a margem direita do rio, de
Jeep, buscar a leitoa para a ceia deles e ele me levaria até a margem esquerda
em seu Jeep e faríamos a travessia numa canoa. O plano dele foi aprovado. Fiquei feliz,
parei de chorar e curti a festa sorrindo.
Então, na manhã seguinte o Tio Osvaldo
matou duas leitoas, limpou-as e colocou-as num saco. Chamou o Padre, eu e as
leitoas fomos no Jeep, aventurando pela estrada barrenta e escorregadia até a
margem esquerda, onde ele deixou seu Jeep em lugar mais alto para a enchente
não levá-lo.
Quanta água! O rio Sapucaí ficou muito
largo e cheio! Que enchente e que emoção atravessar de canoa com as leitoas! Uma
situação inusitada, amei a aventura, a canoa balançava e eu estava curtindo
feliz, nem aí com a chuva aumentando os movimentos da água no rio. Estava feliz
por poder voltar à Itajubá e ficar livre do natal diferente que iria ter que
passar.
Ao chegar em nossa casa no dia 23 de
dezembro, poder abraçar a mamãe já com os meus sete anos completados na véspera
e com uma das leitoas para ela, de presente da tia Nenzinha, chorava de novo,
mas agora de alegria e emoção por podermos estar juntas e colocar meu sapatinho
na janela, ainda acreditando no Papai Noel, que lá colocava nossos presentes!
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Nicanor de Freitas Filho