sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Causo 64 Segunda Lembrança...



Nicanor de Freitas Filho
            Como já contei, morávamos na casa da Dinha, minha avó, que costurava e fazia crochê para ganhar a vida. A Tia Suça trabalhava no Armazém do Zico Pinto, da Rua Capitão Izidro, a Lourdes ajudava a nos criar. Meu Pai era barbeiro no salão do José Perfeito, na Rua Boa Vista, antes do Banco do Brasil, quase em frente ao Bazar Fonseca, que ficava um pouco depois do Foto Parateca. A gente ia muito pouco no Salão. Acho que só para cortar os cabelos e quando precisava, por exemplo, comprar sapatos, porque tinha que experimentar, então íamos ao salão e na hora que folgava, meu Pai cortava nosso cabelo ou nos levava na loja. Lembro muito bem do salão, que era grande, devia ter umas 4 ou 5 cadeiras e era muito movimentado.
            Nessa época, creio que minha Mãe, além de nos criar, somente fazia tricô e crochê, não me lembro dela trabalhando fora, nessa ocasião, que deveria ser por volta de 1947.
            A família da minha Mãe é muito grande, tenho muitos primos e assim, a casa da Dinha todos os dias ficava cheia. Aliás, naquele tempo, acho que todos os dias ou a gente visitava alguém ou alguém nos visitava. Não precisava avisar, nem nada. Quando a gente chegava na casa dos tios, sempre tinha aperitivo e café para os adultos e doces e sucos para as crianças. Se quisesse almoçar ou jantar também podia. Sem avisar. Chegava e lá estava a comida que dava para todos.
            Explicando melhor sobre a Dinha. Ela era irmã da minha avó Carmelita, que faleceu quando minha Mãe tinha por volta de 2 anos. Meu avô Sinico – que não conheci, pois ele morreu em 1943 – ficou com 5 filhas e quem acabou de criá-las foi a Dinha. Assim, para mim ela era minha avó. Não a via de outra forma. Nessa época ela já era viúva. Tinha sido casada com Cassiano. Ela era boazinha demais, principalmente para mim, que era um de seus “netos” preferidos. Acho que eu e a Magda.
            Lembro-me que sempre tinha coisas na casa da Dinha. Lembro, por exemplo, que ela recebia sempre a Santa Teresinha, que ficava em casa, num altar sempre muito florido, na sala de visitas, por uma semana e todas as noites tinha a tal da novena. Mesmo durante o dia, muitas pessoas iam em casa para rezar para Santa Teresinha.
            Meus primos iam lá quase todos os dias. O Tarcísio era meu Padrinho de batismo, junto a Madrinha Cela. Gostava muito dele, que faleceu muito cedo, com sérios problemas de circulação. Lembro-me de falarem que ele tinha “flebite”, mas lembro também, que ele foi para São Paulo fazer uma cirurgia na cabeça.
            Uma noite, ele foi lá em casa e estavam lá outras pessoas, que não me lembro bem, quem seriam. Eu devia ter três ou quatro anos e sempre gostava de me empoleirar no colo dele. Nesse dia, estava no colo dele, quando lhe serviram café. Ele pegou a xícara e ao levar à boca, eu devo ter me mexido e o café caiu. Ele, por instinto, abriu as pernas, para não se queimar e não cair café na roupa e eu caí junto com o café. Bati a boca na beirada da cadeira de madeira, saiu aquela “sangueira”, todos vieram acudir e só me lembro de ouvir:
            “– Quebraram os dois dentes da frente!”
            Doía muito e no dia seguinte amanheci com o rosto muito inchado. Levaram-me ao dentista. Ele examinou e disse:
“– Não quebraram os dentes, eles ‘fincaram’ para cima. Vamos dar um jeito de puxá-los”.
Não me lembro o nome do dentista, nem onde era, mas lembro que minha Mãe e a Madrinha Cela estavam presentes no consultório (Ela era enfermeira chefe do Posto de Saúde). Daí para frente não me lembro mais nada nem como foi resolvido. Não me lembro de ter ficado “desdentado”. Então ele deve ter arrumado uma maneira de puxar os dentes. Mas é a segunda lembrança mais “remota” que tenho. Esta não muito boa!
Só para completar, no outro causo, quando descrevi a casa que morava, a porta de entrada tinha dois degraus. Lembro que uma vez, acho que mandaram arrumar alguma coisa na casa e os ajudantes de pedreiros fizeram o reboque de cimento, no chão ao lado do jardim, bem em frente à porta, logo depois dos degraus.  Aquilo secou e virou uma “casca áspera” no chão. Eu vim correndo não sei exatamente de que nem porque e passei direto pela porta, caindo de boca no chão, bem no lugar onde havia feito o reboque, que já estava endurecido e tudo enrugado. Ralei todo o rosto, principalmente o lábio inferior, do lado esquerdo. Até hoje, tenho uma “pelotinha” que ficou e nunca mais saiu. Mamãe uma vez, brincando falou:
“– Acho que essa pelotinha é uma bolinha de cimento que ficou aí ...”

11 comentários:

  1. Nicanor:
    Leio os seus causos. Continue puxando pela memória !
    Abraços

    Waldomiro

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  2. Tio Nica,

    Adoro seus causos, ouço o sr. contando eqto leio.

    Grande abraço!

    João Paulo

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    1. JP,será que escrevo errado, igualzinho eu falo??? Muito obrigado pelo comentário!

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  3. Freitas
    Meu amigo, agora quem teve uma regressão quase uterina fui eu. A tua família me fez regressar à primeira infância na minha aldeia trasmontana, onde todos os tios e tias, primos e primas, cuidavam de todos entre si, principalmente dos que não tinham pai ou mãe por perto para fazê-lo. Essas experiências só nos fortaleceram, e é bom que as sigas transmitindo aos mais jovens.
    Grande abraço - José Carlos - 30/09/12

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  4. Zé Carlos, isso é exatamente o que quero deixar para meus familiares , inclusive os netos. O que eram as famílias antigamente. Por isso que estou me esforçando para me lembrar de todas essas coisas. Muito obrigado pela sua sempre colaboração! Fraterno abraço!

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  5. ois é Nica, aqui vai mais um comentário via e-mail, conforme me sugeriu, visto que não consigo mesmo mandar publicar dentro daquela ordem maluca das letrinhas. Vc prometeu que faria isso por mim, isto é:PUBLICAR. Na verdade seus causos de infância muito me preocupa, eis que àquela época, quando vc se ralava e se quebrava eu já era titular do time juvenil do meu querido e saudoso NAJÁ ao tempo em que também já cursava o meu ginasial no Colégio D. Bosco. Continuo, cada vez mais apreciando sua capacidade de exercitar retrospectivamente sua tão sadia memória. Isso é raro e felismente eu também já nos 83 consigo escrever o que batizei de MEUS MOMENTOS.
    Outra verdade é que vc consegue mexer e fazer reviver as saudades que sinto daqueles velhos tempos. Parabéns e continue a nos presentear com seus CAUSOS. ZPedro

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    1. Acredito que cada causo que vou contando aqui, todos verdadeiros e, diria, alguns familiares, é exatamente para nos fazer lembrar de como eram as coisas naquela época e fazer com que as pessoas que viveram as mesmas experiências ou muito próximas, se esforcem para lembrarem também e se animam a colocar no papel (ou no computador) também suas lembranças.
      Muito obrigado pelos comentários. Abração.

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  6. Memória fantástica, como ajuda a reavivar a minha.Continue...
    Abraços.
    Suzana.

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    1. Suzana, essa lembrança é mais pelo que passei, do que por ter boa memória!! Vou tentar escrever mais dessa época...
      Muito obrigado pelo comentário.

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  7. NICANOR COMO GOSTEI DO SEU CASO ,me emocinei com a casa da DINHA E TAMBEM COM A santa TERESINHA ,QUE CONTINUA VISITANDO NOSSA CASA. COMTINUE POR FAVOR CONTANDO SEUS CASOS SE FOI EM 43 EU TINHA 5 ANOS.LEMBRANÇAS A SUA familia abraços.DEDETE.

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Obrigado pelo seu comentário! É sempre muito bem vindo.
Nicanor de Freitas Filho